22/09/2006

ALMEIDINHA

Acordou com o som insistente da campainha ecoando no ouvido, como se fosse um sino. Buscou instintivamente o despertador no criado-mudo. Nem o despertador nem o criado-mudo. Abriu um olho com dificuldade tentando se localizar.
_Cadê o quarto?
Se deu conta que tinha dormido no tapete da sala. A campainha insistente continuava a tocar. Se não era o despertador só podia ser o telefone. Seguindo o fio achou o aparelho debaixo do sofá.
_Alô!...
_Almeidinha, tava morrendo de saudade, resolvi antecipar minha volta. Já estou chegando em casa querido! Diz uma voz feminina no outro lado da linha.
Almeidinha!..._Minha senhora, aqui não tem nenhum Almeidinha não.
_ Como não, qual o número desse telefo...
_Eu lá tenho cara de Almeidinha! Diz entre dentes batendo o telefone irritado.
Olha em volta tentando se situar. Percebe então um par de pernas embaixo da mesa de centro. Se abaixando lentamente vai descobrindo aos poucos uma tremenda loura totalmente nua. A campainha do telefone faz o sino badalar de novo em sua cabeça.
_Alô!...
_Almeidinha, já cheguei na portaria do prédio!
Dessa vez, bateu com telefone sem nem responder.
_Mulherzinha insistente cacete! Fala consigo mesmo. Enquanto se abaixa pra continuar olhando a loura peladona, se da conta que também está como veio ao mundo. Não lembrava de nada da noitada. Mas pelo caos em que aquela sala se encontrava, deve ter sido uma loucura. E ele não lembrava de nada.

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_Acordou meu rapaz?
Aquela voz lhe era familiar. Virou-se e deu com Augusto, seu chefe, peladão, abraçando pela cintura uma mulata maior que ele, e empunhando uma garrafa de champanha Francês quase vazia.
_Oi chefe!
_Você estava certo. Depois de trinta anos de casado, sem nunca ter pisado na bola. Já era hora de botar os bichos pra fora. Lembre-me de te promover meu garoto!
Obrigado chefe! Agora lembrava de tudo. Seu chefe não ia muito com a sua cara, pra fazer uma média armou aquela orgia. Seu Augusto só se convenceu mesmo quando viu a mulata. A promessa de promoção só confirma que acertou na mosca.
_Quem era no telefone? Pergunta o coroa palmeando os peitos da mulata.
_Era uma mulher chata pra cacete, me chamando de Almeidinha dizendo que estava chegando. Devia ser engano, ela não ligou mais.
Ele não entendeu nada quando olhou pra cara do chefe. Estava branco como cera, os lábios arroxeando e com os olhos parados olhando pro nada.
_Almeidinhaaaa iu hu, cheguei! Cantou aquela voizinha do outro lado da porta acompanhada do ruído de chave rodando na fechadura.
E ele viu sua promoção e a garrafa de champanha deslizando lentamente entre os dedos do chefe e se espatifando no chão.


Ricco Paes